Parece que não convinha a Deus nascer, pois o nascimento não convém aquele que é eterno. Todavia, convinha sim, a Deus, nascer, morrer e ressuscitar, para provar que só o eterno e imortal tem poder e domínio absoluto sobre a vida e a morte1, podendo nascer mesmo tendo sempre existindo e morrer sem perder a disposição sobre sua própria vida, podendo retomá-la quando lhe aprouvesse. Mas também, e, principalmente, convinha Deus, na Pessoa do Filho, Cristo, nascer numa humanidade para estabelecer um vínculo eterno de unidade e comunhão entre o Divino e o humano; o finito e o infinito; o perfeito e o imperfeito, o completo e o incompleto; entre o tempo e a eternidade, para que o desamor pudesse se reencontrar com o amor; e a morte se reencontrasse com a vida. Assim, convinha Deus nascer, não por Ele, mas por nós, pois a humanidade sem Deus não poderia alcançar a perfeição e rejeitar a violação às leis do amor, senão através da humanidade na qual habita o próprio Deus, chamado Verbo, o qual por livre e espontânea vontade se fez oferta de sangue para nos purificar da culpa pelos pecados de sangue por nós cometidos.2 Cristo não salvaria a humanidade, senão, através a própria humanidade Santíssima a qual habitou, pois se o remédio só é eficaz quando aplicado no corpo do paciente enfermo, é a humanidade incorrupta de Jesus, o remédio para nossa humanidade corroída pela doença do pecado.
1 Isto é o meu corpo oferecido em favor de vós. (São Lucas 22, 19) [2] Depois de ter realizado a purificação dos pecados, está sentado à direita da Majestade no mais alto dos céus, (Hebreus 1, 3)”